Exaustos, correndo, dopados e vazios
Uma curadoria para aprofundar no tema que está nos movimentando esse mês: como trazer uma perspectiva social para a saúde mental?
Olá, tudo bem por aí?
Aqui é a Marcelle Xavier, iniciadora do Instituto Amuta, uma plataforma para transformar as relações através do design. Tudo que fazemos no Amuta é fruto de muito estudo, e criei esse espaço para compartilhar as pesquisas e o processo por trás dos conteúdos e práticas criadas no instituto. O conteúdo de hoje foi criado em colaboração com Marina Galvão e Luciano Lobato.
Vamos realizar um encontro na terça feira, dia 23/11 em uma parceria com o psicólogo Luciano Lobato para conversar sobre “Uma perspectiva social para a saúde mental”. Inscreva-se
aqui
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Nesse mês de novembro vamos aprofundar no tema: Uma perspectiva social para a saúde mental. O nosso convite é expandir o nosso olhar para questões de saúde mental, percebendo sua base estrutural e social.
Queremos também encontrar caminhos para lidar com os desafios do sofrimento psíquico, através do encontro com comunidades e do fortalecimento de laços sociais significativos.
Para quem quiser aprofundar nesse tema com a gente, compartilhamos aqui uma curadoria de conteúdos para ajudar a ampliar nosso olhar sobre o tema: :
1. Wisdom of Trauma é um documentário incrível que coleciona anos de estudos em torno da questão e do impacto do trauma em nossas vidas. Ele traz uma perspectiva do trauma como “o que acontece dentro de você como resultado do que acontece com você". A obra questiona os vícios e os problemas de saúde mental como fruto de escolha individual ou herança genética, e propõe que “nós nos curamos em comunidade”. Você encontra o documentário no site: https://thewisdomoftrauma.com/ (de tempos em tempos eles abrem para quem quer assistir gratuitamente)
2. O programa Greg News de outubro deste ano traz um olhar para a “Positividade Tóxica” como ferramenta de manipulação política e econômica, reflexo da lógica neoliberal. O programa aponta a importância da solidariedade para o cultivo de uma positividade mais saudável. “A tensão entre negatividade e positividade só se resolve na ação coletiva. Ou seja, ela pode ser um enorme catalisador de solidariedade. Ao invés de dançar sozinho, a gente começa a dançar junto. Ao invés de falar para quem tá sofrendo, pensar positivo, a gente se solidariza e ajuda. E se a solidariedade virar trend, talvez ainda haja esperança para o nosso mundo doente.” Assista aqui: :
3. E já que estamos falando de positividade tóxica, o livro Sociedade do Cansaço do filósofo Byung Chul Han não pode ficar de fora. O autor nos apresenta o retrato de uma sociedade que vive a ausência de negatividade: estamos exaustos, correndo, dopados e vazios. “A positividade faz surgir novas formas de violência”. Nesse famoso artigo a jornalista Eliane Brum dialoga com a obra de Chul Han. https://brasil.elpais.com/brasil/2016/07/04/politica/1467642464_246482.html
4. Luciano Lobato oferece uma abordagem de “psicoterapia alternativa radical” que questiona o olhar individualizante para o sofrimento, inclui as questões estruturais, e propõe estratégias de solidariedade e autonomia para saúde mental. Você pode acompanhar o trabalho dele tanto em seu perfil do Instagram (https://www.instagram.com/lucianolobatopsico/ ) quanto no seu blog (https://www.lucianolobato.com.br/blog/ )
5. E foi indicação do Luciano o autor Bernard Guerin, que está por trás da sua proposta de “psicoterapia alternativa radical". O artigo “Therapy in the absence of psychopathology and neoliberalism” traz um panorama do desenvolvimento das terapias com base no modelo biomédico e explicita o objetivo da terapia em manter o sujeito produtivo e funcional. O autor contesta essa abordagem, e propõe uma abordagem “radical” que escapa aos modelos médicos e imperativos neoliberais.
6. E já que estamos falando da influência no sistema econômico na forma como lidamos com nosso sofrimento de maneira individualizada, achamos fundamental investigar um pouquinho sobre a meritocracia. Selecionamos um vídeo da Rita Von Hunty que aborda de maneira profunda e ao mesmo tempo bem humorada o pensamento por trás da Meritocracia: (e para quem quer ir mais longe no tópico Meritocracia, recomendamos o livro “A Tirania do Mérito” de Michael Sandel.)
7. Para fechar o texto “Monumento a um jovem monolito”, o primeiro que me fez questionar o quanto o sistema que estamos inseridos nos afasta do outro, e nos afasta da vida produzindo seres amortecidos e exaustos em série.
“Ao completar trinta anos, você ganhará os olhos duros dos sobreviventes. Só verá sua amada na parte da manhã e da noite, só encontrará seus pais de vinte em vinte dias. E quando seus velhos morrerem, você ganhará um dia de folga para soluçar e gritar que deveria ter ficado mais próximo deles. Sorria, você é um jovem monolito e a vida vai ser pedrada. O trabalho é uma grande cadeia e você sentirá muito alívio por ter uma. A cadeia engrandece o homem, o sangue do dinheiro tem poder. Reze. Reze ajoelhado por uma carreira, dê a sua vida por ela. Viva como todo mundo vive, você não é melhor que ninguém. Porque o dinheiro move montanhas, o dinheiro é a igreja que lhe dará o céu. Sorria, você é um jovem monolito e o mundo é uma pedreira. Eles irão moer você todinho. De brinde, muitos domingos para chorar sua falta de tempo ou operar uma tendinite. Nas terríveis noites de domingo, beba. Beba para conseguir dormir e abraçar mais uma monstruosa segunda-feira. Aquela segunda-feira que deixa cacetes moles e xoxotas secas para sempre. A vida é uma grande seca, mas ninguém sente calor: Nas salas refrigeradas, seus colegas de trabalho fabricam informação e, frios, sonham com o dia dez do próximo mês. Você é o Babaca do Dia Dez, não há como mudar o seu próprio destino. Babaca que acorda assustado, porque ninguém deve atrasar mais de vinte e cinco minutos. Eles descontam em folha e você é refém da folha, do salário, do medo. Ninguém tem o direito de ser feliz, mas você ganhará a sua esmola de seis feriados por ano. E todos nós vamos enfrentar, juntos, um imenso engarrafamento até a praia. Para fingir que ainda estamos vivos. Para mostrar que ainda somos capazes de sentir prazer. Para tomar um porre de caipirinha sentado em uma cadeirinha de praia. É uma grande solução. E você ainda ganhará quinze dias de férias para consertar a persiana, pagar contas, fazer uma bateria de exames. Ninguém quer morrer do coração, ninguém quer viver de coração. Eu não duvido da sua capacidade de vencer: Lembre disso no primeiro divórcio, no primeiro infarto, no primeiro AVC.”
Até logo,
Beijos, Marcelle
PS: Para aprofundar no tema Uma perspectiva social para saúde mental, vamos nos encontrar na terça feira, dia 23/11 (das 10:30h às 12:30h) em uma parceria com o psicólogo Luciano Lobato. Estamos criando um conteúdo exclusivo em parceria com ele para o encontro que será enviado uma semana antes para quem se cadastrar. Inscreva-se aqui para participar conosco: https://forms.gle/PwYeUqX7XtkMMAxCA